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Regime jurídico da conversão de créditos em capital


«Lei n.º 7/2018

de 2 de março

Regime jurídico da conversão de créditos em capital

A Assembleia da República decreta, nos termos da alínea c) do artigo 161.º da Constituição, o seguinte:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei cria o regime jurídico da conversão de créditos em capital.

Artigo 2.º

Âmbito de aplicação

1 – A presente lei consagra o regime da conversão em capital de créditos detidos sobre uma sociedade comercial ou sob forma comercial com sede em Portugal, adiante designadas por sociedade.

2 – A presente lei não se aplica à conversão em capital de créditos detidos sobre empresas de seguros, instituições de crédito, sociedades financeiras, empresas de investimento, sociedades abertas e entidades integradas no setor público empresarial, na aceção do Decreto-Lei n.º 133/2013, de 3 de outubro, alterado pelas Leis n.os 75-A/2014, de 30 de setembro, e 42/2016, de 28 de dezembro.

3 – Não são suscetíveis de conversão em capital nos termos previstos na presente lei os créditos detidos por entidades públicas, excetuando-se as entidades integradas no setor público empresarial.

4 – Não são suscetíveis de conversão em capital nos termos previstos na presente lei os créditos sobre sociedades cujo volume de negócios, tal como resultante das últimas contas de exercício aprovadas, seja inferior a (euro) 1 000 000.

5 – A aplicação do presente regime às entidades integradas no setor público empresarial depende de autorização prévia do membro do Governo responsável pela área das finanças e do cumprimento dos princípios e regras aplicáveis ao setor público empresarial.

6 – O presente regime não prejudica a aplicação de outros mecanismos de conversão de créditos em capital, seja esta operada de modo voluntário, seja por aplicação do previsto no Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE), aprovado em anexo ao Decreto-Lei n.º 53/2004, de 18 de março.

Artigo 3.º

Proposta de conversão

1 – Os credores podem propor à sociedade, nos termos previstos no presente artigo, a conversão dos seus créditos em capital social, quando se verifiquem, cumulativamente, os seguintes pressupostos:

a) O capital próprio da sociedade, tal como resultante das últimas contas de exercício aprovadas ou, caso existam, de contas intercalares elaboradas pelo órgão de administração e aprovadas há menos de três meses, seja inferior ao capital social;

b) Se encontrem em mora, superior a 90 dias, créditos não subordinados sobre a sociedade de valor superior a 10 % do total de créditos não subordinados ou, caso estejam em causa prestações de reembolso parcial de capital ou juros, desde que estas respeitem a créditos não subordinados de valor superior a 25 % do total de créditos não subordinados.

2 – Para efeitos da presente lei, consideram-se créditos subordinados e não subordinados aqueles assim qualificados nos termos do disposto nos artigos 47.º e 48.º do CIRE.

3 – A proposta referida no n.º 1 deve ser subscrita por credores cujos créditos constituam, pelo menos, dois terços do total do passivo da sociedade e a maioria dos créditos não subordinados, e deve ser acompanhada dos seguintes elementos:

a) Relatório elaborado por revisor oficial de contas que demonstre a verificação dos pressupostos referidos no n.º 1;

b) Documento contendo as propostas de alteração do capital social da sociedade, aplicando-se o disposto no artigo 28.º do Código das Sociedades Comerciais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 262/86, de 2 de setembro.

4 – No cálculo do passivo da sociedade referido no número anterior não se computam os créditos referidos no n.º 3 do artigo anterior.

5 – O órgão de administração da sociedade tem o dever de prestar aos credores a informação por estes solicitada com vista à elaboração da proposta referida no n.º 1.

6 – Não sendo prestada a informação referida no número anterior no prazo de 10 dias a contar da data em que a mesma seja solicitada, os pressupostos referidos na alínea b) do n.º 1 são aferidos pelo revisor oficial de contas, em função dos elementos fornecidos pelos credores no que respeita aos montantes em mora, e das últimas contas aprovadas, no que respeita à proporção entre os montantes em mora e o passivo da sociedade.

7 – O aumento de capital social pode ser precedido de redução prévia do capital social para cobertura de prejuízos, incluindo para zero ou outro montante inferior ao mínimo estabelecido na lei para o respetivo tipo de sociedade, caso seja de presumir que, em liquidação integral do património da sociedade, não subsistiria qualquer remanescente a distribuir pelos sócios.

8 – O documento a que se refere a alínea b) do n.º 3 deve:

a) Descrever o conteúdo concreto da operação;

b) Quando aplicável, prever a redução do capital social e respetiva justificação, nos termos do número anterior;

c) Prever o montante do aumento do capital social a subscrever pelos credores proponentes, mediante a conversão dos créditos não subordinados de que sejam titulares em participações sociais, bem como a fundamentação do rácio de conversão do crédito em capital.

9 – Quando aplicável, o relatório do revisor oficial de contas referido na alínea a) do n.º 3 deve demonstrar a verificação do requisito previsto no n.º 7 para a redução prévia do capital social.

10 – A proposta a que se refere o presente artigo deve ser acompanhada de projetos de alteração dos estatutos da sociedade, e, quando aplicável, pode prever a transformação da sociedade noutra de tipo distinto, bem como a exclusão de todos os sócios, desde que as participações sejam destituídas de qualquer valor.

11 – Após o aumento, o capital próprio da sociedade tem de ser superior ao valor do capital social à data da proposta.

12 – Os sócios gozam sempre de preferência no aumento de capital, entendendo-se que, nesse caso, o aumento deve ser realizado em dinheiro, que é obrigatoriamente aplicado na amortização dos créditos que, nos termos da proposta, seriam convertidos em capital.

13 – Se nem todos os sócios exercerem o seu direito de preferência, podem os preferentes subscrever a parte de capital que caberia aos demais, na proporção das suas ações.

14 – Caso não haja intenções de subscrição correspondentes à totalidade das novas entradas, o valor das entradas em dinheiro que sejam efetivamente realizadas é aplicado na amortização dos créditos que não sejam convertidos em capital, proporcionalmente ao montante dos mesmos e com respeito pela prioridade que lhes caiba.

Artigo 4.º

Deliberação dos sócios

1 – Uma vez recebida a proposta de conversão, deve ser imediatamente convocada assembleia geral da sociedade, a qual tem lugar no prazo de 60 dias a contar da data de receção da proposta, com o objetivo de aprovar ou recusar as deliberações nela referidas.

2 – A sociedade pode acordar modificações à proposta com os credores, as quais, no entanto, devem ser facultadas aos sócios com a antecedência correspondente ao prazo legal ou contratual de convocação da assembleia geral da sociedade.

3 – Sendo recusada a proposta, com as eventuais modificações resultantes do disposto no número anterior, não sendo realizada assembleia geral ou não sendo aprovadas ou executadas as deliberações nela previstas no prazo de 90 dias a contar da data da sua receção, podem os credores proponentes requerer ao tribunal competente para o processo de insolvência o suprimento judicial da deliberação de alteração social, nos termos do artigo seguinte.

Artigo 5.º

Suprimento judicial

1 – Para os efeitos da presente lei, o processo de suprimento judicial da deliberação social inicia-se pela apresentação de requerimento pelos credores proponentes da alteração do capital social, acompanhado dos seguintes elementos:

a) A proposta de conversão, acompanhada de todos os documentos que a instruem;

b) O comprovativo da recusa da proposta, quando tal tenha ocorrido, o comprovativo da não realização da assembleia geral, declaração subscrita pela sociedade ou ata da assembleia geral que comprove que a proposta não foi adotada;

c) Uma lista de credores conhecidos para além dos proponentes.

2 – Recebidos os documentos mencionados no número anterior, o juiz nomeia um administrador judicial provisório, devendo a secretaria:

a) Notificar os credores não proponentes que constem da lista de créditos relacionados pelos requerentes da existência da proposta, ficando esta disponível na secretaria do tribunal para consulta;

b) Publicar no portal Citius a lista provisória de créditos, nos termos previstos no n.º 4.

3 – Qualquer credor dispõe de 20 dias a partir da data de publicação no portal Citius do despacho a que se refere o número anterior para relacionar os seus créditos e para referir se pretende igualmente converter os seus créditos em capital, devendo as comunicações ser remetidas ao administrador judicial provisório, que, no prazo de cinco dias, elabora uma lista provisória de créditos.

4 – A lista provisória de créditos é imediatamente apresentada na secretaria do tribunal e publicada no portal Citius, podendo ser impugnada no prazo de 10 dias úteis.

5 – Após o decurso do prazo a que se refere o número anterior, o juiz dispõe de cinco dias úteis para decidir sobre as impugnações formuladas.

6 – Não sendo impugnada no prazo previsto no n.º 4, a lista provisória de créditos converte-se de imediato em lista definitiva, procedendo o juiz, no prazo de 10 dias, à análise da proposta, devendo homologá-la se respeitar a maioria prevista no n.º 3 do artigo 3.º e se se verificarem as demais condições previstas na presente lei.

7 – A lista a que se refere o número anterior é apenas considerada para os efeitos previstos no presente artigo.

8 – A sentença homologatória constitui título bastante para a redução de capital, aumento de capital, modificação dos estatutos, transformação e exclusão de sócios, bem como para a realização dos respetivos registos.

9 – O processo de suprimento judicial a que se refere o presente artigo tem natureza urgente.

Artigo 6.º

Aquisição subsequente do capital

Os sócios podem, no prazo de 30 dias a contar do trânsito em julgado da sentença homologatória, adquirir ou fazer adquirir por terceiro por si indicado o capital da sociedade resultante da alteração, pelo respetivo valor nominal, desde que igualmente adquiram ou paguem na totalidade os créditos remanescentes sobre a sociedade, detidos pelos credores proponentes.

Artigo 7.º

Processo de insolvência da sociedade

1 – Caso a sociedade seja declarada insolvente, produzem-se os seguintes efeitos:

a) Caducam imediatamente, consoante os casos, a proposta prevista no artigo 3.º e os efeitos da deliberação prevista no artigo 4.º;

b) Estando pendente o processo de suprimento judicial previsto no artigo 5.º, extingue-se a respetiva instância.

2 – Uma vez registadas as alterações ao capital social nos termos da presente lei, a sociedade deve comunicar imediatamente as mesmas e o seu registo a qualquer processo de insolvência que se encontre pendente, extinguindo-se a respetiva instância, caso não haja ainda sido declarada a insolvência.

Artigo 8.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

Aprovada em 15 de dezembro de 2017.

O Presidente da Assembleia da República, Eduardo Ferro Rodrigues.

Promulgada em 15 de fevereiro de 2018.

Publique-se.

O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa.

Referendada em 22 de fevereiro de 2018.

O Primeiro-Ministro, António Luís Santos da Costa.»

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