Constituição de grupo de trabalho para dar continuidade aos trabalhos para a da melhoria contínua no acesso da população reclusa, jovem e adulta, ao SNS e para a coordenação operacional dos recursos dos Ministérios da Justiça e da Saúde

  • Despacho n.º 9121/2019 – Diário da República n.º 195/2019, Série II de 2019-10-10

    Justiça e Saúde – Gabinetes das Secretárias de Estado Adjunta e da Justiça e da Saúde

    Determina a constituição de um grupo de trabalho com a missão de dar continuidade aos trabalhos desenvolvidos no sentido de se obter uma melhoria contínua no acesso da população reclusa, jovem e adulta, ao Serviço Nacional de Saúde e de se garantir a coordenação operacional dos recursos dos Ministérios da Justiça e da Saúde e revoga o Despacho n.º 1278/2017, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 26, de 6 de fevereiro


«Despacho n.º 9121/2019

Sumário: Determina a constituição de um grupo de trabalho com a missão de dar continuidade aos trabalhos desenvolvidos no sentido de se obter uma melhoria contínua no acesso da população reclusa, jovem e adulta, ao Serviço Nacional de Saúde e de se garantir a coordenação operacional dos recursos dos Ministérios da Justiça e da Saúde e revoga o Despacho n.º 1278/2017, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 26, de 6 de fevereiro.

O direito dos cidadãos à proteção da saúde e à sua realização através do acesso ao Serviço Nacional de Saúde (SNS) está constitucionalmente consagrado.

Os cidadãos reclusos, que se encontram a cumprir pena de prisão nos Estabelecimentos Prisionais (EP) e os jovens que se encontram a cumprir medida tutelar de internamento nos Centros Educativos, mantêm o direito constitucional à proteção da sua saúde e ao acesso a cuidados de saúde.

O Código da Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade (CEMPL), aprovado pela Lei n.º 115/2009, de 12 de outubro, consagra no seu artigo 32.º, n.º 1, que «é garantido ao recluso o acesso a cuidados de saúde em condições de qualidade e continuidade idênticas às que são asseguradas a todos os cidadãos», e ainda, no seu n.º 2, que «o recluso é, para todos os efeitos, utente do Serviço Nacional de Saúde».

A Lei Tutelar Educativa, anexa à Lei n.º 166/99, de 14 de setembro, desenvolvida pelo Regulamento Geral dos Centros Educativos, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 323-D/2000, de 20 de dezembro, garante aos jovens sujeitos a medida tutelar educativa de internamento, o direito à proteção da sua saúde.

Também a jurisprudência internacional, expressa, nomeadamente, em Resoluções da Assembleia Geral das Nações Unidas ou decorrente da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, aponta para um dever do Estado de garantir a prestação de cuidados de saúde aos reclusos, em condições de dignidade e igualdade, tendo em conta os condicionalismos decorrentes da reclusão.

A saúde em meio prisional é assim parte integrante do sistema público de saúde, e deve ser tutelada pelo Ministério da Saúde.

Esta premissa já fora estabelecida em 2008, num Relatório de um grupo de trabalho conjunto com elementos do Ministério da Saúde (MS) e do Ministério da Justiça (MJ), que propôs a reestruturação dos cuidados de saúde à população reclusa.

Há cerca de 10 anos esse modelo de reestruturação previu, entre outros aspetos, que:

a) Os cuidados de saúde devem ser acessíveis a todos os reclusos, independentemente do tipo e localização da EP onde se encontram e da sua situação jurídico-penal;

b) A prestação de cuidados deve garantir a sua continuidade à entrada na prisão, na transferência entre prisões e pós-libertação;

c) A missão dos serviços de saúde prisional, bem como os seus princípios de organização e de funcionamento, são idênticos em todos os EP, variando apenas na dimensão e natureza dos cuidados prestados localmente;

d) Os cuidados prestados devem ser equivalentes aos disponibilizados em meio livre e adequados à situação clínica do recluso;

e) Os serviços de saúde prisional devem incluir um leque diversificado de dispositivos/intervenções/programas, de forma a responder ao conjunto de necessidades de cuidados;

f) A avaliação do estado de saúde à entrada na prisão é a chave do acesso aos cuidados necessários e adequados a cada recluso.

No entanto, o modelo então defendido ainda não foi implementado no terreno.

Por outro lado, no que se prende com o Plano Nacional de Saúde (PNS), em 2012, o mesmo ainda previa, no seu ponto 33, relativo ao «contexto prisional», que: «A saúde em contexto prisional é tutelada pelo Ministério da Justiça através da Direção-Geral dos Serviços Prisionais. Os reclusos têm direito de beneficiar de cuidados de saúde iguais aos oferecidos à população que não se encontra privada de liberdade, no cumprimento do princípio da equidade e universalidade do Serviço Nacional de Saúde Português.»

Ora, as boas práticas e as recomendações internacionais defendem, todavia, que a saúde em meio prisional deve ser tutelada e gerida pelo organismo do Governo com a atribuição de conceber a política de saúde, no nosso caso, o MS, e não pelo que gere o sistema prisional. Tal é válido, também, nomeadamente, para o sistema educativo.

Ou seja, deve haver independência, normativa, funcional e de meios, entre o sistema de saúde prisional e o sistema prisional, salvaguardada a devida articulação e cooperação, que se afigura imprescindível.

Sabemos que existe uma elevada morbilidade da população reclusa, designadamente ao nível das doenças transmissíveis, doenças não transmissíveis, saúde mental, e comportamentos aditivos e dependências.

No ambiente prisional vivem pessoas nas quais é elevada a frequência de perturbações psicossociais, de patologias infeciosas e de fatores sociais e comportamentos de risco para múltiplas doenças, transmissíveis ou não, em especial associadas à pobreza e à desvantagem social.

O tempo de reclusão deve ser assim encarado como uma janela de oportunidade para atuação do SNS, com enormes vantagens futuras em termos de saúde publica.

É também reconhecida a necessidade de assegurar o acesso dos reclusos aos cuidados de saúde primários, de melhorar a referenciação hospitalar dos reclusos a consultas de especialidade e exames complementares de diagnóstico, e de prestar especial atenção aos jovens internados em centros educativos, cuja reinserção social deve ser priorizada.

Só mediante uma redefinição estratégica clara, relativa a este desígnio, ao nível do Plano Nacional de Saúde, poderá o MS vir a assumir as responsabilidades que decorrem da Lei, no âmbito da saúde prisional, a exemplo do que acontece na maioria dos países da União Europeia, e indo ao encontro das recomendações efetuadas pelas entidades europeias, designadamente pelo CPT – Comité Europeu para a Prevenção da Tortura, para transferir, para o Ministério da Saúde, os cuidados de saúde prestados aos reclusos, apostando em primeira linha nos cuidados de saúde primários.

Neste âmbito, decorrem desde 2017, os trabalhos do grupo constituído através do despacho conjunto dos Ministérios da Justiça e da Saúde n.º 1278/2017, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 26, de 6 de fevereiro, alterado pelo Despacho n.º 3077/2018, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 60, de 26 de março, para a melhoria do acesso dos reclusos ao SNS, encarregue da «avaliação dos constrangimentos existentes no acesso da população reclusa, jovem e adulta, ao SNS, em condições de igualdade com os demais cidadãos, e da proposta das soluções para os ultrapassar».

Da atividade do referido grupo de trabalho resultaram diversas ações, nomeadamente:

a) Preparação dos trabalhos que levaram à publicação da rede de referenciação para a prestação de cuidados de saúde hospitalares no SNS, no âmbito da infeção por vírus da imunodeficiência humana (VIH) e das hepatites virais, para a população reclusa, através do Despacho n.º 283/2018, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 4, de 5 de janeiro de 2018;

b) Reflexão, com o representante da Coordenação Nacional para a Reforma dos Cuidados de Saúde Primários, acerca da necessidade de a este nível de cuidados encontrar soluções flexíveis para dar resposta às necessidades da população reclusa;

c) Envolvimento do Programa de Saúde Prioritário na área da Saúde Mental, da Direção-Geral da Saúde, no sentido de se desenvolver uma estratégia de melhoria do acesso a cuidados de saúde mental dos reclusos e dos jovens que cumprem medida tutelar de internamento nos centros Educativos, priorizando-se estes numa primeira fase. Sensibilização, junto da Coordenação para a preparação do próximo PNS, acerca da necessidade de a saúde em meio prisional entrar claramente, e de modo consequente, na agenda de prioridades do PNS;

d) Elaboração de uma proposta, coordenada pela Direção-Geral da Saúde, com o envolvimento da Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais (DGRSP) e da Ordem dos Médicos Dentistas, de melhoria do acesso dos reclusos à saúde oral;

e) Envolvimento da SPMS – Serviços Partilhados do Ministério da Saúde, E. P. E., em articulação com a DGRSP, via estabelecimento de um protocolo-chapéu e diversas ações concertadas, com o objetivo de assegurar o acesso remoto, nos estabelecimentos prisionais, aos sistemas de informação do SNS.

Chegados a este ponto, entende-se que os trabalhos em curso devem ter continuidade desta feita através de um grupo de trabalho constituído por elementos da Direção-Geral da Saúde e da Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais.

Assim, determina-se:

1 – A constituição de um grupo de trabalho com a missão de dar continuidade aos trabalhos desenvolvidos pelo anterior grupo e de submeter aos membros do Governo com competências nas áreas da Saúde e Justiça propostas conjuntas no sentido de se obter uma melhoria contínua no acesso da população reclusa, jovem e adulta, ao Serviço Nacional de Saúde (SNS), e de se garantir a coordenação operacional dos recursos de ambos os Ministérios.

2 – Que o grupo de trabalho integre os seguintes elementos:

a) Ana Maria Azevedo Vasconcelos Correia, Assistente Graduada Sénior da Carreira Especial Médica, da área de Saúde Pública, ACES Cávado I – Braga, que coordenará;

b) Um representante da Direção-Geral da Saúde;

c) Um representante da Administração Central do Sistema de Saúde, I. P.;

d) Um representante da SPMS – Serviços Partilhados do Ministério da Saúde, E. P. E.;

e) Dr.ª Maria Mafalda Monteiro Vieira de Castro, Assistente Graduada Sénior da Carreira Especial Médica, área de Saúde Pública, Chefe de Equipa Multidisciplinar do Centro de Competências para a Gestão dos Cuidados de Saúde da Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais;

f) Enf.ª Maria João Maurício Pinto Eliseu, Presidente da Direção de Enfermagem da Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais;

g) Dr. João Coias, Diretor de Serviços da Justiça Juvenil da Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais.

3 – O grupo de trabalho pode, sempre que entender necessário, solicitar o apoio, nos termos que considerar adequados, de outros elementos, designadamente, da Direção-Geral da Saúde e da Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais.

4 – O grupo de trabalho funciona com o apoio logístico e administrativo da Direção-Geral da Saúde e da Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais, e apresenta um relatório final aos membros do Governo responsáveis pelas áreas da Justiça e da Saúde sobre os resultados dos trabalhos desenvolvidos.

5 – O exercício de funções no grupo de trabalho não confere o direito a qualquer remuneração ou suplemento, sem prejuízo do pagamento de ajudas de custo, nos termos legais em vigor.

6 – O grupo de trabalho tem um mandato de 6 meses a contar da data de publicação do presente Despacho.

7 – É revogado o Despacho n.º 1278/2017, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 26, de 6 de fevereiro, alterado pelo Despacho n.º 3077/2018, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 60, de 26 de março.

8 – O presente despacho entra em vigor no dia seguinte ao da respetiva publicação.

26 de setembro de 2019. – A Secretária de Estado Adjunta e da Justiça, Helena Maria Mesquita Ribeiro. – 24 de setembro de 2019. – A Secretária de Estado da Saúde, Raquel de Almeida Ferreira Duarte Bessa de Melo.»