Termos em que é efetuada a articulação interinstitucional, para efeitos de referenciação e acompanhamento de pessoas que, por motivos sociais, permanecem internadas após a alta clínica, em hospital do SNS

  • Portaria n.º 38-A/2023 – Diário da República n.º 24/2023, 1º Suplemento, Série I de 2023-02-02
    Trabalho, Solidariedade e Segurança Social e Saúde
    Estabelece os termos e condições em que é efetuada a articulação interinstitucional, para efeitos de referenciação e acompanhamento de pessoas que, por motivos sociais, permanecem internadas após a alta clínica, em hospital do Serviço Nacional de Saúde (SNS), através do recurso a um acolhimento temporário e transitório em resposta social

«Portaria n.º 38-A/2023

de 2 de fevereiro

Sumário: Estabelece os termos e condições em que é efetuada a articulação interinstitucional, para efeitos de referenciação e acompanhamento de pessoas que, por motivos sociais, permanecem internadas após a alta clínica, em hospital do Serviço Nacional de Saúde (SNS), através do recurso a um acolhimento temporário e transitório em resposta social.

O planeamento da alta hospitalar representa um momento crucial para o sucesso da continuação e tratamento da recuperação dos cidadãos, seja através do regresso ao domicílio ou, sempre que a situação de dependência e ou incapacidade não o permita, e por razões sociais, nomeadamente por insuficiente ou inexistente apoio familiar ou de rede formal de suporte, com recurso ao acolhimento em resposta social.

Uma intervenção concertada e articulada, entre os profissionais, os doentes e as famílias, num contexto de planeamento da alta hospitalar é um fator determinante para que seja bem-sucedida a recuperação e a reintegração no período de pós-alta.

Considerando que os serviços e respostas sociais devem ser expandidos para satisfazer as necessidades atuais e futuras da população e alinhado com o 18.º princípio do Pilar Europeu dos Direitos Sociais e com a Estratégia Europeia de Cuidados, o Governo pretende apostar na diversificação de medidas de cuidados de longa duração, cujo modelo de intervenção seja centrado nas pessoas e no reconhecimento das suas competências e capacidades, incluindo as relativas à tomada de decisão.

Conforme preconizado no Manual de Articulação – Saúde + Segurança Social – para o planeamento das altas hospitalares, a preparação das altas hospitalares com base numa intervenção multidisciplinar que tenha em consideração um planeamento personalizado e sistemático traduz-se, indubitavelmente, numa maior satisfação das pessoas com efeitos muito positivos na sua recuperação e incentivo ao desenvolvimento do autocuidado e de uma vida saudável. Nesta linha, deve preparar-se a alta hospitalar através de um trabalho em equipa multidisciplinar, integrando os profissionais da saúde e da segurança social e das instituições de acolhimento, com planeamento estruturado e personalizado, o que corresponderá melhor às necessidades das pessoas potenciando o sucesso da ação e diminuindo a incidência de internamentos sucessivos.

É neste contexto, nomeadamente nos recursos da comunidade a serem ativados, que as entidades do setor social e solidário presentes por todo o território nacional constituem um pilar fundamental na resposta aos cidadãos, em particular aos mais vulneráveis, pela sua proximidade, bem como pela maior capacidade de resposta às situações de carência ou de desigualdade social.

Deste modo, o Governo pretende reforçar a relação de parceria existente entre o Estado e as entidades do setor social e solidário, através da sistemática partilha de obrigações e responsabilidades na prossecução dos fins de ação social.

A adenda extraordinária ao Compromisso de Cooperação para o Setor Social e Solidário, para o biénio 2019-2020, de 13 de novembro de 2020, foi assinada estritamente para estabelecimento dos termos de articulação interinstitucional na sinalização de pessoas para estruturas residenciais para pessoas idosas (ERPI) após as altas hospitalares.

Com efeito, em determinadas situações, apesar de a pessoa ter alta hospitalar, a alta clínica nem sempre resulta na sua saída efetiva do hospital, ou seja, embora não apresente condicionantes do âmbito clínico para ali permanecer, em determinadas situações sociais existe um protelamento do internamento hospitalar quando a pessoa não tem condições para regressar ou permanecer na sua residência, quer seja por ausência de autonomia, por dificuldade ou ausência de capacidade de autocuidado ou por razões pessoais e ou insuficiente ou inexistente suporte familiar ou rede formal de apoio.

A realidade atual gera, assim, constrangimentos vários determinando a adoção de medidas que enquadrem a definição e criação de estratégias articuladas, integradas e concertadas para a redução dos protelamentos de alta hospitalar, pelo que urge assegurar uma avaliação social adequada com vista ao regresso ao domicílio ou, na sua manifesta impossibilidade, o acolhimento da pessoa com alta hospitalar, através da disponibilização pelo setor social de vagas em respostas sociais adequadas, ERPI ou lares residenciais, garantindo no pós-alta a sua segurança e proteção social, contribuindo para a libertação de camas dos hospitais do Serviço Nacional de Saúde (SNS), de forma que estes possam focar-se na sua missão e assim responder efetivamente às necessidades de internamento hospitalar.

O Governo, reconhecendo as dificuldades presentemente sentidas nos hospitais do SNS, entende promover a articulação entre os serviços dos hospitais e os serviços do Instituto da Segurança Social, I. P., para a concretização desta medida de caráter extraordinário e temporário, que importa regulamentar.

Foram ouvidas a Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade, a União das Misericórdias Portuguesas, a União das Mutualidades Portuguesas e a Confederação Cooperativa Portuguesa, CCRL.

Assim, ao abrigo do artigo 5.º, do n.º 6 do artigo 10.º e do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 120/2015, de 30 de junho, na sua redação atual, manda o Governo, pela Secretária de Estado da Inclusão e pelo Secretário de Estado da Saúde, ambos no uso de competência delegada, ao abrigo, respetivamente, do Despacho n.º 7910/2022, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 123, de 28 de junho de 2022, e do Despacho n.º 12167/2022, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 201, de 18 de outubro de 2022, o seguinte:

Artigo 1.º

Objeto

1 – A presente portaria estabelece os termos e condições em que é efetuada a articulação interinstitucional, para efeitos de referenciação e acompanhamento de pessoas que, por motivos sociais, permanecem internadas após a alta clínica, em hospital do Serviço Nacional de Saúde (SNS), através do recurso a um acolhimento temporário e transitório em resposta social.

2 – O disposto no número anterior ocorre em estruturas residenciais para pessoas idosas (ERPI) ou lares residenciais (LR) com acordo de cooperação celebrado entre as instituições particulares de solidariedade social ou legalmente equiparadas e o Instituto da Segurança Social, I. P. (ISS, I. P.), ou em que venha a ser celebrado novo acordo, ambas as situações ao abrigo da Portaria n.º 196-A/2015, de 1 de julho, na sua redação atual, mediante reserva de novos lugares, dentro da capacidade instalada na resposta social.

Artigo 2.º

Âmbito

1 – A presente portaria aplica-se a todas as pessoas que, cumulativamente:

a) Permaneçam, por motivos sociais, internadas nos hospitais do SNS, em situação de pós-alta clínica;

b) Se encontrem impossibilitadas de regressar ou permanecer na sua própria residência, em virtude de não reunirem condições de autonomia ou não disporem de rede de suporte familiar ou outra para prestar os cuidados necessários, ou, na sua existência, esta se manifeste insuficiente;

c) Careçam comprovadamente de uma resposta de acolhimento residencial, após avaliação do perfil pessoal, social e das condições de saúde;

d) Prestem o seu consentimento escrito, direto ou, quando tal não seja possível, o mesmo seja prestado pelo seu representante legal, sempre que aplicável.

2 – Estão excluídas do âmbito de aplicação da presente portaria, as pessoas:

a) Que reúnam os critérios para integrar uma das tipologias de resposta da Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados (RNCCI), de ações ou cuidados paliativos, bem como as pessoas com doença mental grave;

b) Com úlceras de pressão de grau 2 ou superior ou outras situações de saúde complexas, associadas a situações graves de caráter degenerativo que requeiram a existência de uma equipa médica em permanência.

Artigo 3.º

Referenciação, avaliação, admissão e acompanhamento

1 – A referenciação, avaliação, admissão e o acompanhamento das situações com vista ao acolhimento temporário e transitório em resposta social de acolhimento obedece aos procedimentos instituídos na regulamentação em vigor, a qual pressupõe uma avaliação social articulada entre os serviços do ISS, I. P., e o serviço social dos hospitais do SNS.

2 – A referenciação deve ser efetivada junto da equipa técnica da instituição de acolhimento de forma a garantir-se a prestação de cuidados personalizados de acordo com a necessidade de cada pessoa.

3 – Os serviços do ISS, I. P., diligenciam junto da pessoa e, quando aplicável, da família ou do seu representante legal a forma de pagamento da comparticipação familiar, devendo, nos casos em que a mesma não se encontre a ser assegurada, ser desenvolvidos os procedimentos necessários para que a pessoa disponha dos respetivos rendimentos na instituição de acolhimento.

4 – O acompanhamento previsto no n.º 1 é efetivado pelos serviços do ISS, I. P., em conjunto com a equipa técnica da instituição de acolhimento e, sempre que aplicável, com o serviço social do hospital e ocorre ao longo de todo o processo, de forma sistemática e contínua, mesmo pós-admissão, preferencialmente assegurando, sempre que possível, a transição dos cuidados em contexto de resposta de acolhimento para os cuidados no domicílio.

5 – A admissão e o acompanhamento são efetuados em estreita articulação com as equipas técnicas das organizações representativas do setor social e solidário e das respostas de acolhimento e, quando aplicável, com a família ou outras pessoas significativas da pessoa.

6 – O acompanhamento não dispensa a necessidade de nova avaliação social, que fundamente a necessidade de manutenção de acolhimento ou, deixando de se verificar os critérios que deram origem à referenciação e admissão, a verificação de que estão reunidas as condições para transição para outra resposta social e ou para regresso ao domicílio.

Artigo 4.º

Proteção da informação e dados pessoais

1 – A informação partilhada no âmbito do processo de articulação interinstitucional a efetivar ao abrigo da presente portaria destina-se a ser utilizada no estrito exercício das respetivas atividades e atribuições por todos os intervenientes, encontrando-se os mesmos vinculados ao cumprimento da legislação aplicável em matéria de proteção de informação e de dados pessoais.

2 – Os intervenientes no processo estão obrigados a guardar sigilo da informação cujo conhecimento lhes advenha pelas atividades inerentes às ações estabelecidas no âmbito da presente portaria, mesmo após o termo das suas funções.

Artigo 5.º

Gestão de vagas e transporte

1 – As vagas de acolhimento reguladas na presente portaria, em especial as destinadas ao acolhimento de pessoas adultas com alta clínica e social e que permaneçam internadas no hospital, são contratualizadas a título extraordinário, temporário e transitório, através da celebração de adenda ao acordo de cooperação ou através da celebração de novo acordo a outorgar consoante análise casuística a efetuar pelos serviços do ISS, I. P.

2 – Cada instituição que desenvolva, ao abrigo de acordo de cooperação, as respostas sociais de ERPI ou LR pode alocar um mínimo de duas vagas à referida adenda ao acordo ou ao novo acordo a celebrar, para efeitos de aplicação do disposto na presente portaria, respeitando a capacidade autorizada do equipamento.

3 – As vagas referidas no n.º 1 são preenchidas de acordo com a regulamentação em vigor, por indicação dos serviços do ISS, I. P., no seguimento de uma articulação com o serviço social dos hospitais do SNS.

4 – Os serviços do ISS, I. P., devem facultar, por escrito, à instituição toda a informação necessária relativa à pessoa a acolher, bem como o determinado no n.º 1 do artigo 6.º, com vista à sua integração em vaga de acolhimento nas respostas identificadas no n.º 2 do artigo 1.º, contratualizada ao abrigo do disposto na presente portaria.

5 – Após a partilha de todos os elementos identificados no número anterior, a instituição dispõe de um prazo máximo de dois dias úteis para responder à referenciação dos serviços competentes do ISS, I. P.

6 – O transporte inicial das pessoas para a resposta social é assegurado pelo hospital do SNS que efetuou a referenciação.

Artigo 6.º

Comparticipação financeira da segurança social

1 – Para as vagas em ERPI cuja ocupação for efetuada pelos serviços do ISS, I. P., no âmbito da presente portaria, há lugar a uma comparticipação financeira correspondente ao valor mensal convencionado de 1400 (euro) por pessoa, sem prejuízo do disposto no artigo 7.º

2 – Para as vagas em LR cuja ocupação for efetuada pelos serviços do ISS, I. P., no âmbito da presente portaria, o valor mensal convencionado é de 1770,51 (euro) por pessoa, sem prejuízo do disposto no artigo 7.º

3 – O valor mensal convencionado referido nos números anteriores é atualizado anualmente no âmbito do Compromisso de Cooperação para o Setor Social e Solidário e respetivas adendas.

4 – As vagas contratualizadas no âmbito da presente portaria, ainda que não estejam a ser utilizadas, devem manter-se reservadas, havendo lugar ao pagamento de 40 % do valor da comparticipação financeira referido no número anterior, por um período de seis meses, aplicando-se, no caso de não serem preenchidas nesse período, com as devidas adaptações, o disposto na cláusula xv, 1.8, do Compromisso de Cooperação para 2021-2022, que prevê a liberdade de admissão de utentes, findo esse período.

5 – O valor da comparticipação financeira referido nos n.os 1 e 2 inclui as despesas com fraldas e todas as atividades e serviços previstos na Portaria n.º 67/2012, de 21 de março, ou na Portaria n.º 59/2015, de 2 de março, na sua redação atual, nomeadamente:

a) Acolhimento residencial, humanizado, seguro e confortável;

b) Alimentação adequada às necessidades dos residentes, respeitando as prescrições médicas;

c) Cuidados de higiene pessoal;

d) Tratamento de roupa;

e) Atividades de animação sociocultural, lúdico-recreativa e ocupacional, que visem contribuir para um ambiente de bom relacionamento entre os residentes e para a estimulação e manutenção das suas capacidades físicas e psíquicas;

f) Apoio no desempenho das atividades da vida diária;

g) Cuidados de enfermagem, bem como garantia de articulação para acesso aos cuidados de saúde primários e hospitalares; e

h) Administração dos fármacos prescritos.

6 – A despesa com medicamentos é assegurada pela pessoa ou família, nos termos do regime de comparticipação do Estado no preço dos medicamentos, ou pelo hospital do SNS que referencia, caso a pessoa não tenha suporte familiar significativo ou rendimento mínimo para suportar a referida despesa.

Artigo 7.º

Comparticipação familiar

1 – O valor da comparticipação familiar mensal devida pela utilização das vagas reguladas pela presente portaria determina-se segundo as regras de cálculo aplicáveis às respostas sociais ERPI e LR, que constam do anexo à Portaria n.º 196-A/2015, de 1 de julho, na sua redação atual, sendo o valor apurado deduzido à comparticipação financeira da segurança social referida nos n.os 1 e 2 do artigo anterior.

2 – Ao valor apurado da comparticipação familiar, acrescem as despesas com deslocações para os serviços de saúde, quando aplicáveis, sem prejuízo do disposto no n.º 6 do artigo 5.º

3 – O apuramento da comparticipação familiar é efetuado pela instituição de acolhimento e comunicada aos serviços do ISS, I. P., para efeitos do n.º 4 do artigo 3.º e do número anterior.

4 – Sempre que a dedução prevista no n.º 1 não seja efetivada por via da comparticipação familiar, os serviços do ISS, I. P., asseguram o respetivo montante até à sua concretização.

Artigo 8.º

Duração

1 – O acolhimento regulado pela presente portaria e respetivo financiamento pelo valor convencionado nos n.os 1 e 2 do artigo 6.º é efetuado por um período de seis meses, podendo ser renovado por igual período, quando devidamente justificado e fundamentado, nos termos do acompanhamento previsto no artigo 3.º

2 – No mês anterior ao término do prazo estipulado no n.º 1, os intervenientes avaliam a melhor solução para a pessoa, acautelando a sua vontade, no âmbito da cooperação e nos termos previstos no n.º 5 do artigo 3.º

Artigo 9.º

Monitorização

1 – A monitorização da ocupação das vagas previstas na presente portaria é efetuada pelos serviços do ISS, I. P., da direção executiva do SNS e das organizações representativas do sector social e solidário.

2 – Trimestralmente, até ao dia 10 do mês seguinte àquele a que a informação reporta, as entidades referidas no número anterior enviam, aos membros do Governo responsáveis pelas áreas do trabalho, solidariedade e segurança social e saúde, um relatório com a execução da presente portaria.

Artigo 10.º

Entrada em vigor e produção de efeitos

A presente portaria entra em vigor na data da sua assinatura e produz efeitos a 1 de janeiro de 2023.

Em 1 de fevereiro de 2023.

A Secretária de Estado da Inclusão, Ana Sofia Pedroso Lopes Antunes. – O Secretário de Estado da Saúde, Ricardo Jorge Almeida Perdigão Seleiro Mestre.»